terça-feira, 3 de março de 2015

Liberdade... Sobre o livro: O homem à procura de si mesmo, de Rollo May

O livro: “O homem à procura de si mesmo.” Cujo autor, Rollo May, ficou conhecido como um dos psicólogos mais lidos do mundo por sua experiência clínica bem sucedida. Ele também auferiu fama como escritor por sua sensibilidade fora do comum, facilmente reconhecida em seus textos através da sua simplicidade e clareza de expressão.
Nos tempos da faculdade era bastante comum ouvir de professores e colegas algum exemplo ou trecho deste livro, e confesso que na época, o título soou aos meus ouvidos como autoajuda, e este gênero de leitura nunca esteve entre meus prediletos. Há alguns meses, olhando uma por uma das prateleiras de uma livraria - coisa que adoro fazer- me deparei com ele, o tal livro, e resolvi leva-lo e descobrir o que havia de tão especial ali dentro e inserir minha própria opinião.
A temática principal do livro é: a solidão e ansiedade do homem moderno, que inclusive é título do primeiro capítulo, implicando a ideia de que este homem vem enfrentando de forma aguda as problemáticas das mais variadas incertezas acrescidas pela atual sociedade em processo de transformação.
Com base nos comportamentos expositivos cada vez mais comuns nas redes sociais, onde ser visto e validado é garantia de ser amado e aceito, a solidão, liberdade de expressão, bem como a confissão de fragilidade inerente a todos seres humanos, na maioria das vezes perdem espaço. Ações ligadas à esses exemplos, podem oferecer ameaça à imagem saudável, bonita forte e bem sucedida que a vaidade social exige. O que pode acontecer diante dessa dinâmica, é que temerosos pela desaprovação, os indivíduos tendem à entrada no conformismo, se tornando num caminho sem saída.
Não anseio dizer que devemos socializar nossos problemas virtualmente, muito menos deixar de participarmos ativamente das redes sociais, e sim, propor uma reflexão quanto ao que decidimos deixar de ver a respeito do que nos acontece fora delas e como estamos lidando com nossos verdadeiros sentimentos e questões perturbadoras.
De uma forma bem sincera e esclarecida, o autor aventura-se mostrar que por medo da solidão da autoconsciência, continuamos a viver embutidos numa conformidade automática mecanizada e repetitiva percebida nos diversos setores e atuações das nossas vidas. A autoconsciência está no centro do processo de realização das potencialidades que fazem do ser humano uma pessoa “... ela constitui os rudimentos da capacidade de amar ao próximo, ter sensibilidade ética, considerar a verdade, criar a beleza, dedicar-se a ideias e morrer por eles, caso necessário.” Pág. 71
A ansiedade surge quando nos damos conta de que há uma importante questão à qual, não encontramos resposta: o que o Outro quer de mim? O autor sugere que o caminho para autoconsciência é percorrido na maior parte do tempo acompanhados de dores, medos e incertezas causadas pela ansiedade e que como passageiro e facilitador dessa viagem, o mais recomendado é procurar um analista. Em análise, descobrimos que nossa demanda é uma questão entre: nós e nosso desejo, e que nada nem ninguém podem satisfazê-lo.
 “É verdade que a ansiedade neurótica e a solidão podem e devem ser vencidas: a coragem necessária para enfrenta-las reside em tomar medidas para obter ajuda profissional.” Pág. 183
Da infância para maturidade, a coragem é virtude indispensável para cruzar o abismo do não saber de si. A escravidão do medo de agir segundo suas convicções se sobrepõe à coragem de lidar com o risco de ser rejeitado pelo grupo. Segundo o autor esse grupo ou massa social, simbolizam o útero materno – e tornar-se uma pessoa independente é como sentir as dores do próprio renascimento.
Viver refém das expectativas dos outros é uma forma de alcançar admiração e elogios, neste caso, vaidade e narcisismo são inimigos da coragem. Agradar aos outros é o caminho oposto à própria coragem e consequentemente de desenvolver as próprias aptidões e torna-se mais livre e responsável.  “É coragem para ser e confiar em si mesmo, apesar do fato de ser finito: significa agir, amar, pensar, criar, embora sabendo que não se possui a resposta definitiva e que talvez esteja errado.” Pág. 194

A liberdade não aparece como num passe de mágica, ela é conquistada gradativamente, e basicamente, para que isso aconteça é necessário escolher a nós mesmos como provedores, assumindo ainda, responsabilidade por nossa própria existência. Aqui, não importar a época em que vivemos, nem tampouco nossa idade, o que realmente importa são nossas capacidades de alcançar a liberdade interior e viver com integridade.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Inveja





A inveja foi definida por Thomás de Aquino como “Tristitia de alienis bonis”, “a tristeza em relação às coisas boas dos outros”, Napoleão Bonaparte costumava afirmar que “a inveja é um atestado de inferioridade”, e ainda Renato Mezan, que a “inveja tem parentesco com o desejo, a agressividade, a astúcia e a sagacidade, o roubo e a rapina; há algo nela que tem a ver com os olhos”. Faz sentido se voltarmos à origem da palavra, que vem do latim invidia, aquele que não vê, neste aspecto podemos dizer que a pessoa invejosa não vê a si, só vê os outros. 
Mas ainda, devemos estar atentos à diferença entre a cobiça e a inveja. Cobiçar é desejar o que os outros têm, e esta pode ser positiva no sentido de buscar por meios próprios aquilo que o outro tem, comprar um carro ou construir uma casa igual ao do meu vizinho, por exemplo. Agora, a inveja nunca é positiva, é sempre tristeza pela alegria alheia.
É possível inclusive refletir sobre os motivos que levam um adulto a criar perfis falsos em redes sociais para ter a oportunidade de ver e testemunhar a vida de alguém cuja prosperidade e felicidade não são suas também. Este sentimento pode dizer sobre sua incapacidade de viver o que deseja ou sobre suas capacidades que por algum motivo prefere não ver. O sentimento de inveja, tal como o ciúme, é algo que todos temos, em maior ou menor grau. Pessoas emocionalmente menos machucadas e com maturidade o suficiente para aceitar tal constatação podem até vir a fazer bom uso deste sentimento procurando uma análise e se permitindo a descobertas enriquecedoras sobre si mesmo.
Se não o fizer, o ser invejoso pode não avançar muito em sua vida, tanto no campo do amor quanto na profissão. A inveja impede o acesso ao desejo, uma vez que este é o movimento para o caminho das conquistas e realizações.

Procure um analista... “Sapere aude”.

Flávia Tereza
Psicóloga Clínica
CRP - 01/18002